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Sintegração sobre conceitos Hertzberger

     Em um primeiro momento, eu achei o livro "Lições de Arquitetura" muito chato. Mas, ao começar a ler com maior atenção e cuidado, percebi que Hertzberger conseguiu sintetizar muito bem quais pontos devem ser problematizados para entender e projetar espaços arquitetônicos eficientes, ou seja, que atentam ao seu propósito: preferencialmente, o de servir para o aumento da qualidade de vida das pessoas através de interações melhores. Particularmente, não me interessei tanto pelos exemplos trazidos no livro; mas, através deles e da teoria geral, me senti instigado a enxergar esses conceitos em meus lugares de vivência e na imaginação de novos espaços.

    O primeiro ponto a ser discutido é a relação entre o que é público e o que é privado. Esses são termos relativos, porque há diferentes graduações de demarcação que variam de acordo com as comparações. Pensei na minha casa, que divido com outros dois amigos: a rua é totalmente pública em relação ao apartamento, que é, nessa colocação, totalmente privado. No entanto, cada quarto é quase inviolável, o que dá aos outros cômodos caráter (relativamente) público. E isso é espontaneamente variável: se ocupo a mesa da sala para estudar, meus colegas podem evitar usá-la porque me apossei desse espaço, não permitindo que eles também interajam com esse objeto. Aprofundando mais nessas analogias, vejo que a cozinha é o ambiente ideal para interações, já que está entre aquilo que é público e aquilo que é privado, e tem função para todos. A cozinha funciona como um espaço de transição, assim como a portaria do meu prédio, que separa a rua dos apartamentos, ou os corredores da escola. E são esses lugares que Hertzberger aponta como mais propícios à interação entre as pessoas, porque não são nem públicos demais para repelir um indivíduo, nem privado demais para repelir os outros. É também onde esse indivíduo se sente seguro para expressar sua individualidade e consegue entrar em contato com a individualidade do outro. Assim, neles intervalos, as pessoas se reconhecem e quebram o blasé urbano.

    Nesse sentido, é preciso pensar como construir espaços que conduzam os sujeitos a essa experiência. É necessário criar atratividade e possibilidade de interferência. 

    Quanto à atratividade, o primeiro fator que a influencia é a visibilidade: a proporção de privacidade e exposição confere uma característica importante do ambiente. Ruas com longos muros não convidam os transeuntes a permanecerem, nem os moradores a saírem de suas casas. Ruas cujos prédios têm fachadas ativas criam um ambiente de gentileza e interação, incentivando a permanência e, consequentemente, zonas de transição e o diálogo. No entanto, não necessariamente uma alta visibilidade contribuirá para isso, pois seu excesso pode causar insegurança. Cada ambiente tem diversos potenciais de aproveitamento a partir da escolha de como equilibrar esses dois elementos. Na Escola de Arquitetura, o corredor atrás do bicicletário é um espaço com boa privacidade (sem perder a segurança), consequentemente, tem potencial para abrigar aparatos que conectem pessoas que querem estar em ambientes mais quietos e isolados. No entanto, a dificuldade de acesso e a baixa visibilidade de dentro da escola fazem desse corredor um espaço pouco utilizado, não é ainda um bom espaço de transição. Abrir novas fontes de permeabilidade visual permitiria um maior uso, mas (por diminuir a privacidade) de pessoas buscando experiências diferentes. Já em relação ao hall do bicicletário, os corredores visíveis e invisíveis geram a sensação de ser observado sem observar de volta, algo naturalmente desconfortável para qualquer um. Por isso que quem está lá (permanecendo), procura cantos, como as escadas ou os bancos do profeta, de onde têm uma visão mais segura. Outros pontos são a valorização de irregularidades e a articulação de elementos, pois elas tornam o local mais interessante e explorável (não apenas visualmente). Cria-se cantos e preenchimento de vazios.

    Por fim, digo dois exemplos na escola em que se pode problematizar o incentivo (ou a falta dele) para a interferência pessoal. Hertzberger, em seu livro, destaca os projetos em que os usuários podem dar significação / personalização / interpretação à estrutura preexistente. Nesse sentido, cria-se possibilidades a partir da polivalência e do inacabamento sugestivo. Ao lado do DA, perto do depósito de gás, há um espaço aberto inutilizado, exceto pela presença de uma mesa de futebol de mesa. Foi percebido que aquele é um lugar com grande potencial para a realização de atividades ao ar livre, entretanto, ao colocar aquela mesa, se dá ao ambiente uma única função. É um espaço apropriado para praticantes de futebol de mesa, porém não existe grande possibilidade de identificação de outros alunos com aquele intervalo espacial. Talvez ele devesse se espelhar mais no próprio DA, que, em sua aparente desorganização, na verdade, amplifica seu potencial de uso. Seus móveis, embora originalmente com uma única função, aquela para que foram projetados, têm uma faísca de polivalência: as superfícies logo à entrada não servem apenas como estante de livros e revistas, mas também acomodam os doces diariamente vendidos. Todos têm total liberdade para mover sofás, cadeiras ou pufes, e fazer o que quiserem com eles, sentar, deitar, colocar as mochilas. As paredes são pintadas e desenhadas, isso é, personalizadas pelos mais variados estudantes. Não é um lugar completo, no sentido de fechado em suas possibilidades, mas dá aos alunos a liberdade de se sentirem pertencentes e responsáveis.

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